sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Pimentel contra a China

O ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, deu uma entrevista ao Valor falando de ações de proteção que o governo deverá adotar para proteger a indústria nacional do avanço chinês. O "inimigo" é novo, mas a receita é velha:
  • mudar a sistemática nos processos anti-dumping e outras medidas de defesa comercial, que poderiam ser iniciados a partir de estudos do próprio governo;
  • estimular a mudança das regras internacionais de comércio;
  • redução de impostos sobre a produção; e
  • iniciativas para reduzir o custo burocrático para as empresas.
Implemente-se tudo isso, e veremos que poderá até haver ganhos no curto prazo, mas no longo prazo voltaremos a ver a choradeira de empresários em busca de proteção. Gostaria de provocar o ministro a pensar no longo prazo, com políticas que criassem um ambiente de competitividade no país, ao invés de atuar com ações pontuais que se perderão no tempo. E não farei a provocação a partir do nada, mas me basearei em uma referência
Em 1990, Michael Porter, professor da Harvard Business School, publicou na Harvard Business Review um estudo abrangente sobre o que tornava as nações mais competitivas que outras em determinados produtos, intitulado The Competitive Advantage of Nations. A partir do estudo sobre 10 nações com participação relevante no comércio internacional, foram identificados os fatores comuns de sucesso:
  • Estratégia empresarial, estrutura e rivalidade entre as empresas: a concentração de empresas de um mesmo segmento em uma determinada região do mundo faz com que elas ganhem mais eficiência, por conta da rivalidade, na elaboração de estratégias e abordagens comerciais e estrutura de gestão.
  • Presença de empresas e negócios paralelos ou relacionados: capacidade de estimular a formação de uma rede de fornecedores locais de bens e serviços especializados para os setores econômicos mais competitivos da economia, assim como indústrias de bens de capital, cursos universitários especializados etc.
  • Condições de demanda: capacidade de usar a demanda interna como um impulsionador da escala de produção de mercadorias, que desta forma diluem seu custo fixo de produção e se tornam mais competitivas no mercado internacional.
  • Condições dos fatores de produção: capacidade de uma determinada economia não só explorar os fatores de produção de que dispõe em abundância - como recursos naturais no caso brasileiro - mas também de criá-los quando são escassos - como desenvolvimento de ciência e tecnologia e formação de mão de obra especializada.
Qual é a provocação? Trabalhar no desenvolvimento destes pontos em relação a setores considerados estratégicos para o país, tal como apontado pela Política de Desenvolvimento Produtivo. Isto significa, claro, fazer uma coisa que ministério algum gosta em Brasília: trabalhar em conjunto com outros ministérios e órgãos, principalmente Educação, Ciência e Tecnologia, Planejamento, Ipea, ABDI, Finep e BNDES. Apostar no desenvolvimento da competitividade no processo produtivo pode dar mais resultado que incentivos fiscais imediatos. Como é que você acha que a China se tornou competitiva?

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Ajuste fiscal e crescimento

Caros,

Para os que estavam esperando o início deste blog sobre desenvolvimento econômico, anunciado em outubro do ano passado, finalmente ele sai do forno. E começa com a tarefa ingrata de abordar o tema do ajuste fiscal, no momento em que ele é anunciado como um dos objetivos do governo de Dilma Roussef.

Falar em ajuste fiscal no Brasil parece palavrão, muito por conta da experiência terrível que foram os arrochos vividos por nós desde a crise da dívida, no governo Figueiredo, até os anos finais do governo FHC. Mas não devia ser assim. Ajuste fiscal, apesar do caráter contracionista, não é necessariamente sinônimo de recessão. Como não pretendo concluir o assunto, mas apenas instigar as idéias, seguem alguns pontos para pensarmos:
  • Um ajuste fiscal em tempo de crescimento é mais virtuoso que em tempo de recessão, quando a economia precisa de recursos. Imaginemos uma economia do tamanho da brasileira (nosso PIB foi de R$ 3,2 trilhões em 2009), com o consumo da administração pública representando cerca de 21% do PIB. Em um cenário de recessão, com o PIB fechando o ano sem oscilar em relação ao anterior, um corte de 10% do gasto público representaria uma queda de 2% do PIB. Contudo, em um cenário de crescimento de 4,5% de crescimento no restante da economia, um mesmo corte de 10% asseguraria uma alta de 2% do PIB.
  • Em qualquer circunstância, um ajuste fiscal no Brasil não chegaria perto de 10%. A única parcela do orçamento federal sujeita a intervenção direta do gestor é a chamada "demais despesas correntes", que soma apenas 8% do orçamento. O restante são gastos com pessoal, previdência, investimentos e dívida. Ou seja, ainda que o governo cortasse metade disso (4%), no mesmo cenário de crescimento, o PIB cresceria 3,5%
  • Há outra margem de manobra para o gasto público: os gastos com capital. Enquanto os investimentos federais somam apenas 1%, os gastos com juros e encargos da dívida somam 10%. Se os juros caírem por conta do alívio fiscal, o resultado será mais alívio fiscal
  • Por fim, acredito que o caminho mais provável para o governo Dilma não será o corte de gastos correntes existentes, mas a contenção de novos, fazendo com que o gasto público cresça menos que o restante da economia.
É isso